Carta argumentativa
(Texto Argumentativo /Persuasivo)
Características do
texto argumentativo/persuasivo
Além de uma dissertação, a prova de
Redação do Vestibular Unicamp propõe também uma carta argumentativa. O que
diferencia a proposta da carta argumentativa da proposta de dissertação é o
tipo de argumentação que caracteriza cada um desses tipos de texto. O texto
dissertativo é dirigido a um interlocutor genérico, universal. Por outro lado,
a proposta de carta argumentativa pressupõe um interlocutor específico para
quem a argumentação deverá estar orientada. Essa diferença de interlocutores
deve necessariamente levar a uma organização argumentativa diferente, nos dois
casos. Até porque, na carta argumentativa, a intenção é freqüentemente a de persuadir
um interlocutor específico (convencê-lo do ponto de vista defendido por quem
escreve a carta ou demovê-lo do ponto de vista por ele defendido e que o autor
da carta considera equivocado).
É importante justificar por que se
solicita que a argumentação seja feita em forma de carta. Acredite, essa é uma
opção estratégica feita em seu próprio benefício. O pressuposto é o de que, se
é definido previamente quem é seu interlocutor sobre um determinado assunto,
você tem melhores condições de fundamentar sua argumentação.
Vamos tentar exemplificar, mais ou menos
concretamente, algumas situações argumentativas diferentes, para que fique
claro que tipo de fundamento está por trás desta proposta da Unicamp.
Imagine-se um defensor ardoroso da legalização do aborto. Perceba que sua
estratégia argumentativa seria necessariamente diferente se fosse solicitado a
:
escrever uma dissertação sobre o
assunto, portanto, escrever para o nosso "leitor universal";
escrever ao Papa, para demonstrar a necessidade
de a Igreja Católica, em alguns casos, rever sua postura frente ao aborto;
escrever a um congressista procurando
persuadi-lo a apresentar um anteprojeto para a legalização do aborto no Brasil;
escrever ao Roberto Carlos procurando
persuadi-lo a incluir, em seu
LP de final de ano, uma música em favor da descriminação do
aborto.
Você não concorda conosco? Não fica mais
fácil decidir que argumentos utilizar conhecendo o interlocutor? É por isso que
é tão importante que você, durante a elaboração do seu projeto de texto,
procure representar da melhor maneira possível o seu interlocutor, uma vez
conhecido.
Embora o foco desta proposta seja um
determinado tipo de argumentação, o fato de que o contexto criado para este exercício
é o de uma carta implica também algumas expectativas quanto à forma do seu
texto. Por exemplo, é necessário estabelecer e manter a interlocução, usar uma
linguagem compatível com o interlocutor (por exemplo, não se dirigir ao Papa
com um jovial E aí, Santidade, tudo em cima?, muito menos despedir-se de tão
beatífica figura com Pô, cara, tu é do mal!). Mas que fique bem claro: no
cumprimento da proposta em que é exigida uma carta argumentativa, não basta dar
ao texto a organização de uma carta, mesmo que a interlocução seja natural e
coerentemente mantida; é necessário argumentar.
A estrutura de uma carta argumentativa
Início: identifica o interlocutor. A
forma de tratá-lo vai depender do grau de intimidade existente. A língua
portuguesa dispõe dos pronomes de tratamento para estabelecer esse tipo de
relação entre interlocutores.
O essencial é mostrar respeito pelo
interlocutor, seja ele quem for. Na falta de um pronome ou expressão específica
para dirigir-se a ele, recorra ao tradicional "senhor"
"senhora" ou Vossa Senhoria.
O texto dissertativo é dirigido a um
interlocutor genérico, universal. A proposta de carta argumentativa pressupõe
um interlocutor específico para quem a argumentação deverá estar orientada.
Essa diferença de interlocutores deve necessariamente levar a uma organização
argumentativa diferente, nos dois casos. Até porque, na carta argumentativa, a
intenção é freqüentemente a de persuadir um interlocutor específico
(convencê-lo do ponto de vista defendido por quem escreve a carta ou demovê-lo
do ponto de vista por ele defendido e que o autor da carta considera
equivocado).
Mas que fique bem claro: no cumprimento
da proposta em que é exigida uma carta argumentativa, não basta dar ao texto a
organização de uma carta, mesmo que a interlocução seja natural e coerentemente
mantida; é necessário argumentar.
Exemplo de carta argumentativa
São Paulo, 29 de novembro 1992
Prezado Sr. E.B.M.
Em seu artigo publicado pelo jornal Folha
de São Paulo a 1.º de setembro, deparei com sua opinião expressa no Painel do
Leitor. Respeitosamente, li-a e percebendo equívocos em suas opiniões quanto à
veracidade dos motivos que colocaram milhares de jovens na rua, de maneira
organizada e cívica, tento elucidar-lhe os fatos.
Nosso país, o senhor bem sabe, viveu
muitos anos sob o regime militar ditatorial. Toda e qualquer manifestação que
discordasse dos parâmetros ideológicos do governo era simplesmente proibida.
Hoje, ao contrário daquela época, as pessoas conquistaram a liberdade de
expressão e o país vive o auge da democracia. Assim, perante essa liberdade o
Brasil evoluiu. Atravessamos um período de crises econômicas, mas as pessoas
passaram a se interessar de maneira mais acentuada pelo seu cotidiano diante da
própria liberdade existente. Dessa forma, deparamos com uma população
ideologicamente mais madura.
Em sua carta enviada à Folha de São
Paulo, o senhor assegura que a juventude é absolutamente imatura e incapaz de
perceber a profundidade dos acontecimentos que a envolvem. Asseguro que tal
opinião não é a mais justa. Nós já fomos jovens e sabemos perfeitamente que é
uma época de transição.
Mudamos nossos conceitos, nossos desejos
e nossa visão de mundo. Mesmo assim, determinados valores que assumimos como
corretos persistem em nossas vidas de forma direta ou não. Não sei se o senhor
tem filhos, mas eu invejo a concepção que os meus assumem perante inúmeros
acontecimentos. São adolescentes, que se interessam pelos fatos políticos e se
preocupam com o destino da nação, pois estão cientes de que num futuro próximo
serão as lideranças do país.
Outro aspecto relevante em sua carta é o
de dizer que a juventude, generalizadamente é indisciplinada. Tal opinião não
condiz com a verdade. Nas manifestações pró "impeachment que invadiram o
país visando a queda do Presidente Collor, não se viram agressões, intervenções
policiais ou outras formas de violência. Fica, portanto, claro, que a
manifestação dos chamados caras-pintadas não é vazia. Conscientes de que uma
postura pouco organizada não lhes daria credibilidade, os jovens
manifestaram-se honrosamente. Com isso, frente ao vergonhoso papel do próprio
Presidente da República, Fernando Collor de Mello, a juventude demonstrou um
grau de maturidade e percepção maior que o do próprio chefe de estado.
Vemos, com isso, que os jovens visam ao
bem do país e o seu processo de conscientização não se deu de uma hora para
outra. Assim, dizer que a juventude é motivada pelo espírito da época, visando
ao hedonismo é errôneo. Nossos jovens, senhor E.B.M., são reflexos da liberdade
existente no país e a sua evolução político-ideológica. Sem mais, despeço-me.
K.C.M. de M.
PROPOSTA
DE REDAÇÃO
TEMA C
Periodicamente, ao longo da história,
pensadores têm afirmado que a humanidade chegou a um ponto definitivo (o
"fim da história"). O artigo abaixo, parcialmente adaptado, que Denis
Lerrer Rosenfield publicou no jornal "Folha de S. Paulo" em 28/06/2002,
de certo modo retoma essa afirmação.
A POÇÃO MÁGICA
O mundo mudou depois de 11 de setembro. A
administração Bush, inicialmente voltada para um fechamento dos EUA sobre si
mesmos, cujo símbolo era o projeto de escudo interbalístico, que protegeria
essa nação de mísseis intercontinentais, afirma-se agora claramente como
imperial. Sua doutrina militar sofreu uma alteração substancial. Doravante, a
prioridade são ataques preventivos, que eliminem os focos terroristas no mundo,
ameaçando e atacando os Estados que lhes dêem cobertura e, sobretudo, que
tenham armas químicas e biológicas. (...)
Talvez o mundo, no futuro, mostre que o
problema da democracia passa pela influência que países, empresas, sindicatos e
meios de comunicação venham a exercer sobre a opinião pública americana - que
pode, ela sim, mudar os rumos do império. Não esqueçamos que a Guerra do Vietnã
terminou devido à influência decisiva da opinião pública americana sobre o
centro de decisões políticas. Os países deverão se organizar para atuar sobre a
opinião pública americana.
Se essa descrição dos fatos é verdadeira,
nenhuma política futura poderá ser baseada em um confronto direto com os EUA ou
em um questionamento dos princípios que regem essa nação. A autonomia, do ponto
de vista econômico, social, militar e político, pertence ao passado. Poderemos
ter nostalgia dela, mas seu adeus é definitivo. O que não significa,
evidentemente, que tenhamos de acatar tudo o que de lá vier; é imperativo
reconhecer, porém, que a realidade mudou e que embates radicais estão fadados
ao fracasso.
Na época do Império Romano, o general
César ou os imperadores subseqüentes não estavam preocupados com o que se
passava na Gália. Seus exércitos vitoriosos exerciam uma superioridade
inconteste. Era mais sensato negociar com eles do que enfrentá-los. Se uma
Gália moderna achar que pode deixar de honrar contratos, burlar a democracia,
fazer os outros de bobos, mudando seu discurso a cada dia ou cada mês, sua
política se tornará imediatamente inexeqüível.
Contudo, se, mesmo assim, esse povo
decidir eleger um Asterix, convém lembrar que foi perdida para sempre a fórmula
da poção mágica e suas últimas gotas se evaporaram no tempo.
Escreva
uma carta, dirigida ao EDITOR do jornal, PARA SER PUBLICADA. Após
identificar a tese central do texto de Rosenfield,
a) caso concorde com o ponto de vista do
autor, apresente outros argumentos e fatos que o reforcem;
b) caso discorde do ponto de vista do
autor, apresente argumentos e fatos que o contradigam.
Para realizar essa tarefa, além do texto
acima, considere também os que se seguem:
- Ao
assinar a carta, use iniciais apenas, de forma a não se identificar.
1. Ao ver um cordeiro à beira do riacho,
o lobo quis devorá -lo. Mas precisava de uma boa razão. Apesar de estar na
parte superior do rio, acusou-o de sujar a água. O cordeiro se defendeu:
- Como eu iria sujar a água, se ela está
vindo daí de cima, onde tu estás?
- Sim, mas no ano passado insultaste meu
pai, replicou o lobo.
- No ano passado, eu nem era nascido...
Mas o lobo não se calou:
- Podes defender-te quanto quiseres, que
não deixarei de te devorar. (Adaptado de Esopo, "Fábulas". Porto
Alegre, LP&M.).
2. Então saiu do arraial dos filisteus um
homem guerreiro, cujo nome era Golias, de Gate, da altura de seis côvados e um
palmo. (...) Todos os israelitas, vendo aquele homem, fugiam diante dele (...).
Davi disse a Saul: "... teu servo irá, e pelejará contra ele". (...)
Davi meteu a mão no alforje, e tomou dali uma pedra e com a funda lha atirou, e
feriu o filisteu na testa, e ele caiu com o rosto em terra. E assim prevaleceu
Davi contra Golias, com uma funda e uma pedra. (Adaptado de "I
Samuel", 17, 4-50.)
3.
Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem
sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam
diretamente, legadas e transmitidas pelo passado. (Karl Marx, "O 18
Brumário de Luís Bonaparte"... Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977).